ULISSES NA TERRA DOS
CICLOPES
Com sua frota de doze
navios, chegou Ulisses ao país dos ciclopes.
À tarde aportou a uma
ilha, que lhe ficava mais próxima, e dela avistou os monstros
gigantescos, que pastoreavam imensos rebanhos de cabras e carneiros,
pelas montanhas verdes e íngremes. Vozes horríveis e estranhas,
misturadas com os balidos das cabras e dos carneiros, chegavam aos
ouvidos dos marinheiros, aumentando-lhes o pavor.
Ulisses conhecia alguma
coisa acerca dos cruéis ciclopes e, entre outras, sabia que
ignoravam completamente a arte de navegar. Dessa forma, tranqüilizou
seus companheiros, convencendo-os de que poderiam dormir
sossegadamente, ainda aquela noite, na ilha, pois os gigantes não
poderiam atravessar o mar, para atacá-los.
Exaustos das aventuras
passadas, dormiram profundamente.
Ao amanhecer, Ulisses
escolheu doze companheiros, dos mais valentes, e disse aos outros:
— Amigos, esperem-nos
aqui, enquanto vamos conhecer os ciclopes e os seus costumes. Não
abandonem o navio, porque pode ser que tenham de voltar às carreiras
e partir na mesma hora. Estejam, pois, vigilantes e com as mãos nos
remos.
Tomaram o navio e
remaram até a costa. Desembarcaram. Ulisses levava uma clava, os
outros levavam às costas um barril de vinho.
Atravessaram uma vereda
ensombrada por lindos carvalhos, indo dar à boca de uma caverna.
Olharam seu interior: era limpa e vasta.
Entraram
cautelosamente. Num canto, pilhas de queijo fresco se enfileiravam,
ao lado de potes cheiros de creme. Carneirinhos e cabritinhos de
poucos dias, separados pela idade, enchiam a gruta de balidos.
Ulisses e seus
companheiros acenderam o fogo, comeram alegremente o queijo fresco e
apetitoso e se preparavam para assar um dos cabritos, quando um
ciclope apontou no caminho que se abria diante da boca da caverna.
Trazia às costas o tronco de um enorme carvalho que, atirado no
solo, produziu um ruído semelhante ao trovão. Atrás vinha as
cabras e ovelhas, debicando a relva que bordejava o caminho. Foram-se
Ajuntando em frente da
caverna, como se aguardassem ordem para entrar.
O ciclope tocou-as para
dentro e, depois, fechou a entrada da caverna com um bloco de pedra
tão grande que Ulisses com seus doze companheiros não conseguiriam
mover do lugar. Sentou-se numa saliência da caverna e ia ordenando
as cabras e ovelhas que iam depois amamentar as suas crias. Feito
isto, acendeu o fogo, que crepitou logo em chamas altas.
Ulisses e seus
companheiros examinaram o ciclope à luz da fogueira.
Parecia o pico de uma
montanha enorme. Seus cabelos, anelados e embaraçados, caíam-lhe
sobre as espáduas largas. A sua testa era tomada de uma orelha à
outra por uma pestana de cílios grandes e pretos, sob a qual
brilhava um único olho, vermelho como brasa. O fogo, iluminando a
gruta, fez Polifemo — que era o nome do ciclope — perceber
Ulisses e seus companheiros que se colaram às paredes da caverna,
para não serem vistos.
— Estrangeiros, —
lhes disse Polifemo — que desejam aqui?
A voz rouca e terrível
desse monstro gelou o coração dos gregos.
Ulisses respondeu-lhe:
— Somos gregos e
estamos há muitos anos longe de nossa pátria. Os ventos contrários
lançaram-nos aqui. Dê-nos hospitalidade e comida.
— Onde deixaram o
navio? — tornou a perguntar o ciclope.
— Netuno quebrou meu
navio e os ventos dispersaram seus restos sobre as ondas inquietas do
mar, — respondeu-lhe Ulisses.
Sem dizer mais nada, o
ciclope com as mãos abertas apanhou dois homens de uma vez.
Atirou-os barbaramente ao chão, para quebrar-lhes a cabeça, e os
foi comendo, ainda quentes, membro por membro.
Depois de tão farto
jantar, bebeu um pode de leite e deitou-se para dormir num canto,
entre as cabras.
Ulisses pensou em
avançar com sua clava contra o ciclope. Lembrou-se, porém, de que
seria inútil, desde que todos juntos não seriam capazes de mover a
pedra que fechava a boca da caverna. Angustiados, passaram a noite na
gruta de Polifemo.
No dia seguinte, mal
raiou a madrugada, Polifemo levantou-se, e, apanhando da mesma
maneira da véspera, dois outros companheiros de Ulisses, comeu-os
calmamente. Arredou a pedra, soltou o rebanho e saiu, fechando
novamente a entrada e deixando os pobres gregos prisioneiros.
Entretanto, Ulisses não
desesperava. Não parava de pensar como se havia de salvar.
Aproveitou um galho de oliveira, que encontrou num canto da caverna,
fez-lhe uma boa ponta e guardou-o com cuidado.
Como os companheiros
continuassem aflitos, ele lhes disse:
— Vamos passar o
nosso dia o melhor possível. Havemos de nos salvar.
Fizeram fogo, comeram
queijo, assaram um cabrito novo, enquanto aguardavam a volt do
ciclope.
Já as sombras da noite
desciam sobre as serras, quando o ciclope entrou, tocando para dentro
seu rebanho. Fez o que fizera no dia anterior. Depois, correndo os
olhos sobre Ulisses e seu infelizes companheiros, apanhou mais dois
moços e os comeu gostosamente.
Nessa hora, Ulisses
encheu um vaso de vinho que ofereceu ao ciclope, dizendo-lhe:
— Beba, ciclope, essa
bebida agradável.
Polifemo bebeu de um
trago o vinho e pediu a Ulisses:
— Dê-me mais dessa
bebida e eu o recompensarei. Qual é o seu nome?
— Meu nome é
Ninguém, — respondeu Ulisses, dando-lhe mais vinho.
— Bem, — respondeu
ciclope — a recompensa que lhe prometi é a seguinte: eu o comerei
por último.
Não tardou muito, e
Polifemo, tonto, caiu, ali mesmo, adormecendo profundamente.
Ulisses, sem perder
tempo, enfiou na fogueira a ponta do galho que preparara
cuidadosamente. Quando se tornou brasa, enfiou no único olho do
ciclope. Apoiando o galho com toda a força no seu corpo, Ulisses
torceu-o dentro do olho, para esmaga-lo bem. As pestanas do monstro
chiavam na órbita vazia, como água na qual se pôs um ferro quente.
Louco de dor e
sentindo-se cego, Polifemo pôs-se a gritar de tal maneira que fazia
as montanhas estremecerem, como se tremessem de medo. Apalpando aqui,
apalpando ali, como um desesperado, Polifemo procurava Ulisses na
caverna. Não o encontrando, chamou os ciclopes vizinhos, com grande
uivos. Ao ouvi-los, vieram todos acudir-lhe.
— Quem o persegue,
para lançar gritos tão aflitivos? — perguntavam-lhe aglomerados à
entrada da gruta.
Polifemo
respondia-lhes:
— Ninguém! Ninguém!
— Pois, se ninguém o
persegue, por que nos chama?
E, julgando que
Polifemo estivesse sonâmbulo ou louco, retiraram-se para suas
cavernas.
Gemendo sem parar,
Polifemo esperou a madrugada. Enquanto isto, Ulisses preparava meios
para escaparem.
Aproveitou umas
correias de couro de cabra que encontrou num canto e amarrou com elas
seus companheiros no entre das ovelhas mais robustas.
Quando a aurora
anunciou aos animais a hora de saírem para o pasto, Polifemo arredou
um pouco a pedra, de sorte que pudesse sair só um animal de cada
vez. Sentou-se na abertura e apalpava cada animal para impedir que
saíssem Ulisses e os seus companheiros.
Estes, porque
estivessem jeitosamente amarrados, saíram sem que o gigante os
percebesse.
Ulisses, por sua vez,
meteu-se entre as pernas de uma ovelha e agarrou-se fortemente aso
seus pelos espessos, conseguindo escapar também.
Logo que se sentiram
longe do alcance de Polifemo, Ulisses soltou-se da ovelha e
desamarrou seus companheiros. Apanharam alguns carneirinhos e
cabritos bem tenros e desceram em disparada pela vereda que conduzia
ao mar. Tomaram o navio, levantaram as âncoras e partiram.
Polifemo percebera o
ruído dos passos ligeiros de seus inimigos e logo o barulho das
águas agitadas pelo remos, cheio de cólera, arrancou o pico de uma
montanha e arremessou-o ao mar na direção do ruído das águas. A
rocha quase atingiu a proa do navio e levantou tão grande onda que
fez o barco voltar para a praia e encalhar. Ulisses, fazendo de um
tronco de árvore uma alavanca, desencalhou o navio, enquanto seus
companheiros, podo toda a energia nos remos, puseram o navio fora da
barra. Entretanto, o gigante, na sua fúria, atirou outro enorme
bloco de pedra sobre o mar e, com tal violência que quase atingiu a
popa do navio. Uma onda maior se levantou e empurrou o navio mais
para o meio do mar.
Dando aos remos, os
bravos marinheiros fizeram o barco ganhar distância, e a ilha dos
gigantes de um olho só, em pouco tempo, perdera-se no horizonte azul
das águas do mar.
Belas recordações da minha infancia do livro As Mais Belas Historias.
ResponderExcluirShow, e bom relembrar
ResponderExcluir