quinta-feira, 1 de maio de 2014

MERECE SER LEMBRADO II -- A ONÇA E O BODE


A ONÇA E O BODE

O Bode pôs a enxada às costas e saiu para o mato.
Ia procurar um lugar onde pudesse fazer sua casinha. Do lado da cachoeira, o Bode viu um lugar roçadinho e disse:
— Oh! Nosso Senhor me está ajudando. Este lugar aqui é bem bom.
O Bode, então, foi para o mato, cortou os esteios, os caibros, a cumeeira, as ripas, amontoou tudo no lugar e foi-se embora.
Logo depois, chegou a Onça e disse:
— Ontem eu rocei o mato e, hoje, encontro aqui todo o material para levantar a casa! Que bom!
A Onça, muito satisfeita, furou os buracos, fincou os esteios, pôs a cumeeira, ripou e foi-se embora.
Dali a pouco, chegou o Bode com a picareta para furar os buracos e armar a casa.
Quase caiu de espanto, ao ver a casa já armada. E disse:
— Oh! É Nosso Senhor que me ajuda! Agora só falta cobrir a casa.
O Bode pegou a foice e foi apanhar capim. Voltou com uns feixes enormes de capim, cobriu a casa e disse:
— Amanhã eu faço o resto.
E foi-se embora. Chegou a Onça, logo depois e disse:
— Que engraçado! A casinha está quase pronta! Agora só falta barrear! Quem será que me está ajudando?
A Onça barreou a casinha e deixou-a prontinha. Foi-se embora, foi buscar a mudança. Mal a Onça desapareceu no mato, chegou o Bode e disse:
— Mas Nosso Senhor é muito bom! A casinha está prontinha! Agora vou buscar minha mudança.
Nisso, a Onça chegou com a mudança às costas e pôs cada coisa no lugar. Mas lá vem o Bode com os seus trastes! Entra, e que vê ele? A casa toda mobiliada, e a Onça a fazer a comidinha lá dentro.
Ficaram os dois muito admirados e exclamaram ao mesmo tempo.
— Ah! Era você, amigo Bode, que me estava ajudando?
— Ah! Era você, amiga Onça, que me estava ajudando?
O Bode e a Onça, então, resolveram experimentar viver juntos. Combinaram todos os serviços e todas as tarefas.
Assim, cada semana seria de um para caçar.
Tudo ia muito bem.
Mas, um dia, a Onça caçou um cabrito e foi com ele às costas até a casa. Chegou ao terreiro, jogou o cabrito no chão, e disse, muito prosa:
— Amigo Bode, vá tratar este bichinho que eu trouxe para comermos hoje.
O Bode — coitado! — ficou tremendo de medo e, assim mesmo, preparou o cabrito e botou-o na mesa.
A Onça comeu até fartar-se, mas o Bode pretextou doença e não quis comer.
No outro dia, era o Bode que devia caçar.
Ia ele triste pelo mato adentro, quando, de repente, que vê ele? Uma onça, uma onçona! Vem cambaleando, e cai morta, bem pertinho dele.
O Bode viu logo que a Onça havia sido atingida pelos tiros de um caçador e saíra correndo, até que perdera as forças e viera morrer ali, junto dele. O Bode apanhou embira, amarrou os pés da Onça e foi puxando-a, puxando-a até a casa.
Lá de longe gritou:
— Amiga Onça! Ó amiga Onça, venha ajudar-me!
A Onça viu o Bode com aquela onçona, fingiu que não ouviu o chamado e escondeu-se.
O Bode puxou a Onça até a porta da casa e gritou:
— Amiga Onça, trouxe um bichinho para a senhora preparar para o jantar.
A Onça ficou muito desapontada e perguntou:
— Ó amigo Bode, como foi que o Senhor caçou esta onça?
— Ora, ora, do mesmo modo como a Senhora caçou o cabritinho — disse o Bode todo orgulhoso.
Como a Onça não acreditasse e insistisse em saber como o Bode havia conseguido matar a companheira, disse o Bode:
— Olhe, amiga Onça. É bom saber, porque pode lá acontecer um dia...
— A Onça já foi ficando arrepiada.
— Está vendo este guizo no meu pescoço? Pois isso me dá uma sorte, amiga Onça! Com este guizo posso caçar os animais todos da florestas, e sem esforço. Sabe como eu faço? Eu pego o guizo e jogo no animal e ele cai morto, mortinho, no mesmo instante.
A Onça começou a olhar o Bode com o rabo de olho.
Depois, vendo a Onça toda trêmula, disse:
— Amiga Onça, cuidado que eu lhe jogo o guizo...
— Deixe de brinquedo, amigo Bode.
A Onça foi-se esgueirando para perto da porta.
O Bode tornou a dizer-lhe:
— Amiga Onça, eu lhe jogo o...
A Onça — zás! — pulou para o meio do terreiro.
O Bode, então, disse.
— Amiga Onça, já vai o guizo...
A Onça abriu numa carreira louca pelo mato adentro.
O Bode fingiu que corria atrás dela e gritava:
— Amiga Onça, lá vai o guizo! Lá vai o guizo!
A Onça embrenhou-se pelo mato e nunca mais foi vista.
O Bode entrou em sua casinha e disse: — Foi mesmo Nosso Senhor quem me ajudou!
E o Bode viveu feliz na casinha que a Onça ajudara a construir e o seu gênio ajudara a adquirir.

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