A lágrima
Havia, no tempo dos
gênios e das fadas, um silfo que servia de correio entre a terra e o
céu.
Os antigos pensavam que
o céu era composto de sete esferas de cristal e o silfo tinha
entrada em todas elas menos na última.
Na sétima e última
esfera era que havia a porta do Paraíso. Junto a ela havia um anjo
com larga espada flamejante que guardava a entrada.
O silvo baixou à
terra, voejou e aqui e ali a velava:
— Deixai-me entrar,
sim.
E ele respondia sempre:
— Não! Mais tarde!
Afinal, quando mais uma
vez o silfo o importunava, disse-lhe o arcanjo:
— Vou fazer-te a
vontade, contando que tragas para o céu uma coisa que agrade muito
ao coração de Deus.
— Pois bem. Eu
buscarei.
— Então vai e traze.
O silvo baixou à
terra, voejou e aqui e ali a procurar coisa que servisse e dizia de
si para si:
— Eu custarei a
achar. Coisas más há aos milhares, mas que, agradem muito e logo a
quem... a Deus! Será difícil, mas tentarei.
Passou por sobre vales
e montes, cidades e serras, mares e campos e afinal, numa choupana,
viu à porta muitas pessoas que choravam.
Indagou com a vista e o
ouvido, e viu que era uma criancinha que estava sofrendo. Agonizava,
e ia morrer. O silfo, invisível, aproximou-se.
— Que pena, murmurou
ele, como padece este pequenino!
Tomado de dó, voou
sobre ele e para poupar-lhe a agonia, colhe o seu último suspiro.
Logo, partiu para o céu.
O anjo lá estava e
perguntou:
— Vens triste?
— Sim, mas trago uma
coisa que há de agradar.
— O que é?
— O último suspiro
de um pequenino; os pais lá ficaram chorando e olha, sabes tu,
formoso anjo, eu também chorei.
— Pois eu aceito a
tua oferta. Agrada sim e muito. Mas... desce para a terra de novo e
traz outro presente.
O leve silfo, admirado,
desceu novamente à superfície da terra e dizia, procurando por toda
a parte:
— Levei o suspiro do
inocente e não pude, no entanto, entrar no céu.. Que levarei agora?
Nisto ouviu um zumbido,
seguido de outro e mais outro. Olhou para baixo e desanimou. Muitos
guerreiros atravessavam uma fronteira e outros a defendiam impedindo
a passagem do rio.
O silfo voou para o
lado dos que defendiam a pátria contra os invasores. Nessa ocasião
viu um jovem soldado que depois de se bater como um leão, caíra
sobre a bandeira.
O silfo aproximou-se e
tirou-lhe o coração palpitante.
Levou-o ao céu e
mostrou-o ao anjo que velava.
— É o nobre coração
de um soldado que morreu pela pátria, disse o silfo, agradará?
— De certo, mas não
é chegada ainda a vez de aqui subires. Volta e tem paciência.
Assim fez o silfo e foi
correr países longínquos. Aí viu, na África, um bando de negros
antropófagos que supliciavam um missionário; o padre, moço ainda
estava amarrado a uma árvore.
Tinha nos braços uma
cruz a cabeça pendida. Dezenas de flechas o crivavam no tronco que
lhe servia de poste de sacrifício.
O silfo tomou-lhe a
cruz e regressou velozmente.
É impossível que,
desta vez, levando o símbolo da fé, permita o anjo que eu penetre
nos lugares celestes.
Mas enganava-se o
pertinaz silfo: a dádiva foi muito bem recebida, pois simboliza a fé
e representava o sacrifício de um mártir, mas ainda desta vez lhe
foi vedada a entrada.
Depois levou o silfo
uma rosa branca e diáfana.
— Que coisa mais pura
e inocente que uma flor?
Mas a porta do céu
continuou trancada.
Não desanimava o silfo
e uma tarde volitava sobre montanhas e despenhadeiros.
Como a ventania e o
frio aumentassem, o silfo acolheu-se a uma gruta.
Nela habitava um
salteador que roubava os viajantes e até os massacrava se não
pagavam resgate.
Era temido por sua
crueldade e havia anos havia foragido, na serra.
Na planície seria ele
preso e enforcado.
Seus companheiros
tinham sido presos e outros justiçados.
Ele, havia largo tempo
não se lembrava de orar, blasfemava e muitas vezes erguia o punho
fechado para o céu.
Nessa tarde, como de
costume, ele saíra armado.
O tempo porém, estava
ameaçador, nuvens escuras tapavam o sol e um grande relâmpago
coriscou e depois repercutiu, ribombando, pelos alcantis da serra.
De súbito, o salteador
ver surgir entre as sarças, correndo, um vulto humano. Era uma
criança.
De certo se detivera a
brincar e se transviara. Pelas suas feições demudadas, pelos olhos
chorosos, via-se que estava assustada. Estava perdida!
Enganara-se e subira um
carreiro em vez de descer para o campo; ela não viara o salteador.
Este entesou o arco
terrível; ajustou-lhe uma flecha e apontou.
A criança chegara ao
meio da clareira. Era um menino, um guardador de cabras.
Quando o bandido se
dispunha a atirar o rapazinho ajoelhou-se e com as mãos no peito e
os olhos no céu, pôs-se a rezar.
A fisionomia da criança
já não estava tão descomposta; parecia que a fé lhe dava forças.
O silfo, do alto,
contemplava a cena.
O salteador sentiu que
o arco se afrouxava e que um não sei que lhe subia ao coração.
Largou a seta e
aproximou-se do rapaz; vendo que este tremia sossegou-o.
— Estás perdido?
A criança respondeu
afirmativamente.
— Nada dirás que me
viste. Não?
— Não, senhor.
O salteador levou-o até
certa distância; carregou-o nos braços para passar uma torrente,
pois a chuva caía forte e engrossara as águas. Só o deixou junto
ao povoado.
— Obrigado, senhor,
disse o menino e, tomando-lhe as mãos sem que o salteador o pudesse
impedir, beijou-as com efusão.
— Adeus! Oh! Exclamou
o bandido, o rapazito fez-me pena...
Ao chegar à gruta,
aquele homem sentiu-se comovido, e isto percebeu o silfo que o
acompanhara sempre.
Os aspecto daquela
criança rezando no meio dos penhascos, com tanta fé, perturbara a
alma do perverso salteador da montanha.
Sentiu dentro do peito
uma onda enorme de remorso, de saudade dos tempos idos e chorou.
Pelo rosto desciam-lhe
as lágrimas, as primeiras lágrimas de arrependimento. Ajoelhou-se e
pediu perdão.
O silfo viu aquele
pranto e colheu uma lágrima.
Lépido e contente, foi
levá-lo ao anjo e contou-lhe o que vira.
— Bem, podes entrar,
disse o arcanjo abrindo o pórtico do céu. Trouxeste-me uma dádiva
rara e magnífica: — a lágrima de um arrependido!
O título do livro é A
ÁRVORE DE NATAL.
O nome do autor não
foi possível identificar, mas na parte da capa que resta aparece um
nome Tycho Brahe.
A editora é LIVRARIA
QUARESMA, Rio de Janeiro, 1959.
O livro inicia-se com
AO LEITOR.
Mais um livro de
histórias é hoje oferecido às crianças brasileira.
A ÁRVORE DE NATAL
ou TESOURO MARAVILHOSO DE PAPAI NOEL, revela mais uma vez ao
bom público que nos tem protegido e amparado com sua benevolência,
o progresso que temos incutido à nossa Biblioteca Infantil que é a
única no Brasil.
O presente volume que
foi confiado a reconhecido e autorizado escritos, contém muitas
histórias originais e várias adaptações de novelas de mestres
como Shakespeare, Tolstoi, Perrault, La Fontaine, etc. ... Não são
a repetição do que já temos publicado ou mesmo parodiado, mas sim
trabalhos coligidos de maneira que a ficção, sempre imaginosa, ande
a par com o fim de todo o livro infantil: deleitar, instruindo.
Tais contos, como agora
damos à luz da publicidade, são um precioso elemento de educação
doméstica, pois, como diz La Fontaine: “ Quem não acha um prazer
extremo em ouvir histórias mesmo inverossímeis?” São uma formosa
coletânea que agradará a nossos leitores e principalmente aos seus
filhos e que virá demonstrar nosso constante empenho de ser útil e
agradável às crianças que falam a nossa bela língua portuguesa.
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